O mercado financeiro não esconde certa ansiedade com a sucessão do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, a partir de 2025. A menos em parte, a desancoragem das expectativas de inflação e a incorporação de prêmios na curva de juros futuros refletem esse sentimento dos investidores.
É a primeira vez desde que a autonomia do BC entrou em vigor, em fevereiro de 2021, que haverá uma troca de comando na autoridade monetária após o início do mandato de um presidente da República. Até então, o Executivo indicava um nome assim que assumia o cargo. A partir de agora, essa regra valerá para os próximos presidentes eleitos.
“A mudança na presidência do BC é um assunto debatido pelo mercado desde a entrada do atual presidente da República. Com a aproximação do fim do mandato de Campos Neto o tema toma maiores proporções”, lembra André Meirelles, diretor de alocação e distribuição da InvestSmart XP.
Eu sei o que o PT fez em BCs passados
O temor do mercado se dá, principalmente, por causa de erros de governos passados do PT, em especial quando o BC estava sob o comando de Alexandre Tombini, durante a gestão de Dilma Rousseff.
O episódio, conhecido como “cavalo de pau”, ainda está fresco na memória da economia brasileira. Em agosto de 2011, a inflação acumulada em 12 meses superava os 7% e vinha em acensão. O BC já havia subido a taxa Selic de 10,75% para 12,50% nos meses anteriores para tentar domar a alta dos preços e alcançar a meta no ano seguinte. Porém, na reunião do último dia daquele mês, cortaram o juro básico em 0,50 ponto porcentual.
“Ainda há uma lembrança muito ruim da gestão Tombini, que largou o compromisso com a meta de inflação e jogou o manual no lixo”
Alexandre Schwartsman, economista e ex-diretor de Assuntos Internacionais do BC
Talvez, por isso, o atual comandante do BC tenha manifestado ao governo Lula a importância de indicar o seu sucessor com antecedência, evitando um hiato na sucessão. Em um evento no início de abril, Campos Neto defendeu uma transição “mais suave possível” e ressaltou que o mais importante para quem senta na cadeira de presidente é “ter firmeza de dizer não”.
Quem vem?
Trata-se do principal receio do mercado. Entre as apostas, o provável substituto seria o atual diretor de política monetária, Gabriel Galípolo. “É um nome associado a um BC disposto em fazer o que o Executivo quer”, diz Schwartsman.
No jargão do mercado, significa uma postura mais suave (“dovish”) em relação à condução dos juros, o que manteria o risco de inflação elevado. Também na lista, os nomes dos atuais diretores Paulo Picchetti e Rodrigo Alves Teixeira correm por fora.
Seja quem for, a possibilidade de um Banco Central mais tolerante com altas nos preços mantém atraente a alocação em títulos indexados à inflação, observa a Nord Research. Profissionais do mercado financeiro afirmam que a incerteza sobre que vem prejudica a ancoragem das expectativas de inflação na meta e favorecem a incorporação de prêmios nos juros futuros.
O diretor de operações de um banco estrangeiro, porém, vê exagero na reação do mercado. “A autonomia do BC garante independência no processo, sendo um valor intangível que cria um novo histórico para o país”, observa. “Ou seja, quem vencer as eleições [presidenciais de 2026] também vai ter de conviver com um nome que não é o escolhido por ele”.