Seis reuniões atrás, em agosto do ano passado, quando a taxa Selic ainda estava em 13,75%, o Copom vinha sendo criticado pelo exagero na cautela. O alvo preferido era o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
Depois de dez meses e seis cortes consecutivos de meio ponto percentual, veio a decisão desta quarta-feira (8). Por 5 votos a 4, o Comitê do BC decidiu contrariar a sinalização dada no encontro anterior, em março, quando havia contratado uma queda adicional de 0,50 ponto percentual agora em maio.
Não menos importante. Dos quatro votos contra, todos vieram dos diretores indicados pelo governo Lula: Gabriel Galípolo, Paulo Picchetti, Ailton Aquino e Rodrigo Teixeira.
Ou seja: isso mostra que, com a saída de Campos no final do ano, o BC tenderá a uma postura mais leniente – afrouxando os juros mesmo sob a ameaça de baderna fiscal. Natural que venha alguma reação do mercado, a começar por juros futuros mais altos.
Em março, o grande destaque havia sido a remoção do plural no comunicado, que fez toda a diferença. O Copom antevia uma redução semelhante “na próxima” reunião, em maio – e não mais “nas próximas”, como tinha dito nos comunicados anteriores.
“A mensagem parecia clara: estava chegando a hora de parar de reduzir os juros ou o ritmo de queda”, observou o ex-presidente do BC e sócio fundador da Rio Bravo Investimentos, Gustavo Franco, em comentário.
Lá atrás, em março, o mercado apostava que a eventual freada nos cortes viria só na reunião seguinte, a de junho. Mas o fato é que, de lá para cá, o cenário mudou. Tanto no exterior, mas em especial no Brasil, com a meta fiscal zero em 2024 sendo abandonada, o que levou a declarações mais duras de membros do Copom, incluindo Campos Neto.
“O BC tem essa flexibilidade para se ajustar às mudanças”, ressalta o ex-diretor do BC e sócio-fundador da Mauá Capital, Luiz Fernando Figueiredo. “O importante é dizer o que está na cabeça do Copom.”
Canja de galinha não faz mal
Portanto, seria uma surpresa se o Copom tivesse mantido a dose agora. Como isso não aconteceu, o caldo de galinha servido ao final do encontro hoje não foi tão indigesto.
Ex-diretor do BC, o economista-chefe do Itaú, Mario Mesquita, previa uma redução no ritmo de queda, em meio ao aumento de incertezas tanto no contexto externo quanto no doméstico. “O pano de fundo de incerteza mais elevada inspira cautela”, afirmou.
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Em comentário, Mesquita cita a demora no início do ciclo de queda dos juros no exterior, em especial por parte do Federal Reserve, além da previsão de menos cortes na taxa dos Estados Unidos neste ano.
Por aqui, o ajuste das contas públicas ficou mais tardio e incerto, principalmente após a decisão de decretar estado de calamidade no Rio Grande do Sul. Na visão dos ex-BCs, o equilíbrio fiscal não tão rígido, somado ao aumento dos riscos externos, fomentou o debate sobre a redução do ritmo de cortes, bem como o total de queda da Selic.
Há um ano, quando o arcabouço substitui o regime do teto de gastos, Franco, da Rio Bravo, já alertara: “A consequência mais óbvia de uma política fiscal meio morna é que o Executivo perde força ao tentar emparedar o Banco Central para impor a redução nos juros”.
Cabe, então, o BC fazer o que acha mais correto tecnicamente, emenda Figueiredo, da Mauá.
A partir de agora, o ciclo de alívio monetário parece estar se aproximando de um limite. Na pesquisa Focus, a expectativa quanto ao nível terminal dos juros básicos neste ano vem sendo ajustado gradualmente para cima. Ainda não parece haver dúvida de que a Selic cairá a apenas um dígito – ao menos por ora.