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Com dólar mais alto, Casas Bahia e Boticário planejam rever os preços para o segundo semestre

Se você não viajou para fora nas últimas semanas, talvez ainda não tenha sentido o efeito da alta do dólar. Mas acredite: ele virá em breve. Varejistas e indústrias já estão de olho no vaivém do câmbio para medir o impacto que ele trará para seus custos. E muitas já preveem que, no segundo semestre, os preços vão ficar mais altos por causa do câmbio.

É o caso do Grupo Boticário, do setor de cosméticos, dono de marcas como Quem Disse Berenice, Vult, Eudora e a própria O Boticário. Segundo Artur Grynbaum, vice-presidente do Conselho do grupo, do total de matérias-primas utilizadas para a fabricação dos sabonetes, cremes, shampoos e outros produtos, 15% são importados. Outros 35% também são balizados pela moeda americana, mesmo sendo produzidos no Brasil.

O preço final de produtos do Boticário – ou de qualquer outra empresa – não muda a cada oscilação do dólar, claro. Afinal, os contratos de compra de matéria-prima são fechados com antecedência, e acabam embutindo a média de uma série de cotações ao longo do tempo. Mas, se ficar claro que o câmbio se estabilizou em um novo patamar, as planilhas de custo mudam – e as de preço final também. É assim que o dólar alto impacta na inflação por aqui.

“A gente sempre espera um tempo para entender se é apenas uma instabilidade passageira”, diz Grynbaum. “Não acho que o dólar vai ficar em R$ 5,50, mas agora vai se acomodar em um patamar mais alto do que a gente achava no começo do ano.” 

A saída, então, é reajustar os preços de algumas linhas de produtos. A mesma lógica está sendo adotada pelas Casas Bahia, especialmente no segmento de eletrônicos, como celular, computador e televisores. São produtos que levam uma grande quantidade de componentes importados.

Segundo Renato Franklin, CEO da varejista, a alta do dólar ainda não chegou ao consumidor porque as lojas ainda estão vendendo produtos que estão em seus estoques, encomendados pela varejista quando o dólar estava mais baixo. Mas eles estão se esgotando e… “A partir do segundo semestre, os preços serão outros”, diz Franklin.

Inflação na veia

A dinâmica relatada pelas duas companhias ilustra bem o efeito do câmbio sobre a economia. E mostra que o problema não se restringe a sabotar a vida de quem pretende ir para a Disney: ela atrapalha o planejamento das empresas, inibe investimentos e, principalmente, gera inflação.

Qualquer produto importado, seja ele industrializado ou uma matéria-prima, vai custar mais caro quando o dólar sobe. E isso vale também para aquilo que é produzido no Brasil,  mas que acompanha os preços  internacionais, caso de commodities agrícolas como soja, trigo, milho e café.

“O Brasil  não é  autossuficiente em trigo, por exemplo. Se importamos trigo mais caro, sobem também  o pão francês, o biscoito o macarrão.”, exemplifica Andre Braz, coordenador adjunto do índice de preços ao consumidor da Fundação Getulio Vargas

Esse efeito não é imediato: o dólar oscila todos os dias, mas o planejamento das empresas, desde a compra das matérias-primas até a definição do preço mais adequado ao cliente, é feito para um horizonte mais longo. Por isso, o desafio é filtrar o que é transitório do que é de fato uma nova tendência para  a cotação.

Algumas empresas conquistam um fôlego adicional para esperar que a cotação se estabilize fazendo o que se chama de hedge cambial. São contratos financeiros que compensam, de certa forma, o efeito negativo da oscilação do câmbio. Mas como essas operações têm um custo,  nem sempre vale a pena fazer hedge de toda a operação.

Mas depois de tanto tempo assistindo ao vaivém da cotação, as empresas começam a acreditar que o dólar não vai voltar para o patamar que estava no começo do ano. E começam a considerar em seu planejamento para os próximos meses uma taxa de câmbio mais alto. Uma espécie de profecia auto-realizável, em que as expectativas para o futuro praticamente contratam uma piora dos preços.

Por que esse sobe e desce?

O dólar acumula uma alta de cerca de 13% este ano em relação ao real. Somente em junho, a valorização da moeda americana é de pouco mais de 6%. O que explica esse movimento é, primeiramente, o comportamento do dólar no mundo: a perspectiva de que o juro nos Estados Unidos fique alto por mais tempo atrai muito dinheiro global e, consequentemente, fortalece a moeda americana.

Esse é um fenômeno que atinge as divisas do mundo todo. Mas o real está sofrendo muito mais. E isso tem a ver com a preocupação com o quadro fiscal do país. Cada vez que o governo indica que pretende gastar mais, e não reduzir as despesas, ele sinaliza para os agentes econômicos que o país vai ter mais inflação, menos crescimento. E um risco maior de honrar a sua dívida no longo prazo. Quem financia essa dívida, comprando os títulos públicos emitidos pelo Tesouro Nacional, vai exigir um retorno mais alto.  Ou escolhe se proteger em moeda forte – que é o dólar.

O câmbio a R$ 5,50 é um patamar que assusta, diz Braz, da FGV. E ele tem muito a ver com a incerteza sobre o cenário macroeconômico, que não vai durar para sempre. “O problema começa à medida que essa cotação se consolida, e o transitório fica permanente. Aí afeta a inflação”, define.

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