Os investidores já devem se preparar. Vem aí a taxação dos fundos exclusivos e de investimentos no exterior (offshores). A proposta avançou para a última etapa no Congresso, após a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovar nesta quarta-feira (21) o relatório do projeto de lei (PL) 4.173.
O texto não sofreu quaisquer alterações em relação ao aprovado pelos deputados e deve ser apreciado pelos senadores já na semana que vem. A expectativa é de que a votação na Casa seja simbólica, encaminhando a matéria para a sanção presidencial nos próximos dias.
Com isso, as mudanças devem entrar em vigor a partir de 2024. Vale lembrar que a taxação atinge uma ‘minoria da minoria’, como mostraram dados da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) a pedido do Investnews, afetando os apenas chamados “super-ricos”.
No entanto, isso não significa que a taxação tenha um alvo certo e esteja mirando as pessoas físicas com grande patrimônio. Para Haraly Rodrigues, da Roncato Advogados, o ponto focal é alterar a regra de tributação de investimento para fechar brechas por causa de diferenças nas regras, muito inferiores ou mesmo inexistentes.
“Busca-se atingir os investimentos que estão cada vez mais relevantes no atual momento econômico nacional, não apenas quando da transferência de recursos ao investidor, mas sobre a aplicação”, explica a diretora jurídica, em comentário.
O que muda na prática?
O primeiro ponto, então, é entender o que exatamente muda com a proposta. De um modo geral, o PL prevê a cobrança de Imposto de Renda sobre os rendimentos em aplicações financeiras no exterior (offshores) e em fundos de investimentos fechados, detidos por pessoas físicas no Brasil.
“Offshore define os fundos de investimentos feitos fora do Brasil, cuja sede está em outro país, com ativos internacionais e com o gestor dos investimentos estando, na maior parte dos casos, no Brasil. Por outro lado, os fundos exclusivos são frequentemente voltados a membros de um mesmo grupo ou família”, explica Marcio Miranda, sócio do escritório Maia & Anjos Advogados.
É, portanto, uma proposta voltada à tributação de quem investe no exterior ou em fundos elaborados de maneira personalizada ao cotista, com incidência anual da renda obtida. Antes, a taxação ocorria apenas no momento do resgate de aplicações financeiras. Por isso, o entendimento é de que os fundos passam a ser tratados com a mesma isonomia.
“No caso dos fundos exclusivos, trata-se de uma justiça tributária, pois iguala a tributação de grandes fundos ao que já era aplicado há bastante tempo aos demais fundos disponíveis para o mercado em geral. Já a taxação das offshores é uma realidade entre os países desenvolvidos”.
Laísa Santos, advogado do Schiefler Advocacia, em comentário.
Ainda assim, a alíquota deve ficar em 15% para os fundos de longo prazo e em 20% para os de curto prazo – portanto, abaixo da carga tributária sob os assalariados, que pode chegar a 27,5%. Além disso, o contribuinte pode atualizar o valor de bens e direitos no exterior à alíquota de 8%, desde que declarados já no exercício do IRPF deste ano.
A incidência do tributo independe dos valores aplicados e do resgate do investimento pelo contribuinte. No entanto, em relação aos ativos no Brasil, o projeto de lei propõe alterar a tributação de determinados fundos de investimento, com uma tributação nos moldes do “come-cotas” sob os fundos fechados, a ser cobrada nos meses de maio e novembro.
Como era | Como será |
Cobrança de IRPF apenas no momento do resgate | 15% sobre o lucro anual das offshore 15% fundos exclusivos de longo prazo 20% fundos exclusivo de curto prazo |
Não havia antecipação do IR | Come-cotas para fundos exclusivos (maio e novembro) |
Sem norma estabelecida para Trusts | Regulamentação dos Trusts |
Para Luiz Henrique Veronezi, sócio do PLKC Advogados, outros pontos importantes são: a possibilidade de compensar perdas em aplicações financeiras no exterior; a revogação da isenção na alienação de bens e direitos adquiridos no período de não residência e do critério do cálculo de ganho de capital com origem em moeda estrangeira.
Veronezi destaca que, “pela primeira vez no ordenamento jurídico brasileiro, haverá a disposição expressa sobre o tratamento fiscal aplicável aos trusts”, que vinha ganhando evidência. Em linhas gerais, o trust pode ser definido como um mecanismo que permite que uma pessoa faça uso de determinado bem sem ser titular ou proprietária do mesmo.
“É uma forma de sucessão ou de manutenção de patrimônio sob administração de terceiros, comumente utilizados nos Estados Unidos”, ilustra Rodrigues, da Roncato Advogados. Ela explica que a ausência de regulamentação dos trusts torna necessário um PL complementar para evitar discussões sobre a legalidade da tributação desse rendimento.
A norma, ainda, traz que não serão tributados a variação cambial dos depósitos em conta corrente, cartão de crédito e débito mantidos no exterior. Essa menção decorre da modernização do transporte de moedas internacionais para viagens, que é a possibilidade de abertura de conta internacional.
Meta zero
Já do ponto de vista macroeconômico, o projeto é apontado como importante para ajudar a cumprir a ambiciosa meta fiscal da equipe do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de déficit zero nas contas públicas no ano que vem. A estimativa é de que, combinadas, as medidas gerem arrecadação de cerca de R$ 15 bilhões em 2024.
“O projeto é fundamental para que o Orçamento de 2024 tenha um rombo minimamente menos dilatado”.
Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos, em comentário.
Assim, o governo está prestes a obter mais uma vitória na área, após a aprovação da reforma tributária no Senado, encerrando uma longa espera de cerca de 40 anos. Porém, no caso da proposta que prevê a simplificação na cobrança de impostos, o texto sofreu modificações e voltou para a Câmara. A ver, então, se algum “jabuti sobe na árvore”.
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