Pelo menos por agora, a economia dos Estados Unidos não é tão parte do problema. Cabe ao Brasil caminhar com a próprias pernas para dissipar com o pessimismo que tomou conta do mercado nos últimos dias. E, por “Brasil”, entenda “presidente Lula”. Esta é a análise de Tony Volpon, economista e ex-diretor do Banco Central, em entrevista exclusiva ao InvestNews.
Na gringa, o saldo é bem positivo: o Federal Reserve manteve inalterada a taxa de juros, ainda na faixa entre 5,25% e 5,50%. Na tradicional entrevista com o presidente da autoridade monetária, um contido Jerome Powell apareceu em frente às câmeras para repetir a cantilena de que o Fed está atento ao mercado de trabalho, ao consumo dos americanos e aos indicadores de inflação, e que há uma melhora progressiva no cenário macroeconômico.
Um Powell anódino era tudo o que o mercado esperava: a quarta-feira (12) foi de euforia nas bolsas de Nova York, embaladas pelas apostas majoritárias – entre elas a de Volpon – de que os juros na maior economia do mundo começarão a cair em setembro. O otimismo, por sua vez, está baseado na leitura para lá de positiva do CPI de maio, que é o indicador de inflação ao consumidor por lá – como o nosso IPCA. Ele fechou o mês passado em 0,00%.
Quase nada a ver com a frase “o ambiente externo mostra-se mais adverso” que abre o comunicado da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). O cenário mudou, e para melhor.
“O exterior, que poderia estar jogando contra [a economia brasileira], agora joga a favor”, avalia Volpon. “Mas tudo depende das escolhas que serão feitas pelo presidente Lula nos próximos dias e semanas”.
A partir de Washington, onde reside, Tony Volpon acompanha a derrocada do Ibovespa e a disparada do dólar ante ao real. O degringolar dos números, analisa o economista, é sinal de que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, bateu em um “limite político” ao tentar neutralizar a desoneração da folha de pagamentos com restrições à compensação de créditos tributários do PIS/Cofins.
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A grita do empresariado, especialmente da agroindústria, ressoou em Brasília e encontrou seu alento no Senado Federal. Nesta quarta-feira, o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), tornou sem efeito parte da MP originada no governo. A decisão do parlamentar contrariou Haddad, que se disse sem “plano B” para o caso e acabou protagonizando manchetes que apontam seu enfraquecimento no cargo.
“O Haddad teve várias vitórias neste processo de aumento de receita, mas agora bateu em um limite político. Para mim já estava claro que o governo montou uma bomba-relógio com o arcabouço fiscal ao estabelecer um teto global [de crescimento das despesas em termos reais] de 2,5% e, ao mesmo tempo, vincular gastos previdenciários ao salário mínimo, que cresce em ritmo muito maior”, explica Volpon. “Essa instabilidade estava lá o tempo inteiro, e agora veio à tona”.
Para o economista, o desgaste político de Haddad não interessa nem ao mercado nem ao governo Lula. Não é ok para o mercado porque, em um governo de esquerda como o atual, ter na Fazenda um político de perfil moderado e que entende a importância de ter as contas públicas em ordem é basicamente contar com um aliado. E também não é bom para o governo porque uma eventual queda do ministro implodiria a confiança dos agentes econômicos.
“O mercado teme o que aconteceu com o Joaquim Levy: uma guinada à esquerda [do governo] que levou a uma elevação do prêmio de riscos”, resume o economista, em referência ao ex-ministro da Fazenda que tinha o apoio do mercado mas que foi politicamente esvaziado pela então presidente Dilma Rousseff. Levy acabaria saindo do governo no fim de 2015. Sete meses depois, Dilma foi afastada do cargo e depois sofreu o impeachment.
Os movimentos recentes do dólar e da bolsa mostram que o mercado apertou o botão do pânico, pontua o ex-BC. “O que o mercado está precificando hoje é um quase fim do mundo”, diz. “Olhando para os fundamentos econômicos, o câmbio não deveria estar em R$ 5,40, a curva de juros não deveria estar indicando tão fortemente um aumento da Selic, o juro real não deveria estar acima de 6%. Estes são preços de crise, não preços normais”.
A solução? Começaria por uma contundente demonstração de que o presidente Lula confia em Haddad. De que o ministro segue prestigiado no governo. Volpon acredita que as últimas horas mostraram um Haddad “claramente isolado e enfraquecido”, de modo que Lula precisa, de fato, sinalizar ao mercado que o ex-prefeito de São Paulo “ainda é o cara”.
O passo seguinte seria Haddad apresentar uma agenda mínima para atacar o crescimento dos gastos previdenciários, mais acelerados do que as regras que tratam das despesas gerais do governo. Volpon argumenta que o governo precisa apresentar um plano de voo claro, além de prazos para tocar as propostas.
“Se houver esses freios de arrumação a situação pode melhorar rapidamente”, projeta o economista, “o cenário externo positivo pode acelerar essa melhora”