Selic em 10,50% até o fim de 2025 e o Natal deste ano com o dólar além dos R$ 5,10. E, ainda assim, inflação acima da meta neste e no próximo ano. Para o economista-chefe do Citi, Leonardo Porto, tudo isso é consequência do que ele chama de “afrouxamento fiscal”.
Essa nova condição começou com a mudança da meta fiscal para 2025 e 2026. E se agravou diante da dificuldade que o governo vem enfrentando para obter as receitas necessárias ao cumprimento da meta deste ano.
Com a consolidação fiscal mais lenta, diz o economista, a trajetória da dívida pública vai piorar, o que joga para cima o prêmio de risco – o retorno extra que o investidor exige quando vê uma incerteza maior no horizonte.
De fato, os ativos financeiros se deterioraram significativamente nesta semana. O dólar chegou a superar a casa dos R$ 5,40, enquanto o Ibovespa caiu para baixo da linha dos 120 mil pontos. Os juros futuros, por sua vez, sobem como um foguete, sem dar ré, e já indicam a aposta em uma alta da Selic no ano que vem.
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Esse ambiente contribui também para a piora das expectativas de inflação, e para a fragilidade do câmbio. Tudo isso deve fazer com que o Copom interrompa o corte de juros na reunião da semana que vem. E, desta vez, a decisão deve ser unânime. Além disso, Porto acredita que o comunicado vai reiterar algo que o presidente do Banco Central, Roberto Campos, já tem dito: os próximos passos da política monetária serão guiados pelo compromisso inequívoco de fazer com que as expectativas de inflação convirjam para a meta.
Para 2024, a projeção de Porto para o IPCA está em 4%. Para 2025, 3,5%. Ambas acima da meta, de 3%. Já o PIB deve crescer 2% este ano e 1,5% em 2025.
A situação fiscal jogou gasolina na fogueira da inflação. O economista do Citi diz que já vislumbrava uma Selic estável há algumas semanas, por causa do ritmo de crescimento econômico mais forte. “O mercado de trabalho não para de bombar”, diz. E tudo isso acontece mesmo com uma Selic acima de 10%.
Como resposta, a inflação de serviços, mais sensível ao aumento de renda, subiu com força: a média móvel trimestral desse indicador está em 5,1%, ante 1% da inflação de bens.
Essa história de os serviços pressionarem a inflação não é exatamente nova. E tem sido constantemente mencionada pelo Banco Central. A questão, segundo Porto, é que agora o consumo dos bens começa a reagir – o que deve jogar também para cima a inflação desse setor.
O PIB relativo ao primeiro trimestre já deu esse spoiler. Isso por causa do corte de juros que o Copom já realizou, de 3,25 pontos percentuais. Na verdade, o juro médio cobrado do crédito para pessoa física caiu ainda mais: sete pontos percentuais. O desafio do BC, então, é ainda maior.
“O alívio das pressões de inflação não virá pelo lado da atividade. Teria que vir de uma queda das commodities e do câmbio”, afirma. Mas o que tem ocorrido é justamente o contrário: as matérias-primas e o dólar estão em alta. “Então não há espaço para o BC continuar cortando a Selic.”
O rumo da política monetária americana é também uma variável relevante nesse cenário. Para Porto, de qualquer forma, as questões domésticas são mais preponderantes para definir o rumo da Selic. “Não tenho a menor dúvida de que os Estados Unidos são importantes, mas é preciso tomar cuidado para não exacerbar essa importância. O impacto [sobre o Brasil] tem sido relativamente limitado”, diz.
A variável determinante é mesmo a parte fiscal, e o efeito dela sobre as expectativas. A bola está com o governo.