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Herdeiros de fundador da Amil vencem disputa com Receita de quase R$ 700 mi

Herdeiros do fundador da empresa de saúde Amil e controladores da rede de diagnósticos Dasa, os irmãos bilionários Pedro de Godoy Bueno e Camilla de Godoy Bueno Grossi ganharam uma disputa de quase R$ 700 milhões com a Receita Federal na semana passada. O caso envolveu a cobrança de impostos sobre uma parte do patrimônio deixado pelo pai Edson de Godoy Bueno, que morreu em fevereiro de 2017.

Para explicar o contexto: Godoy Bueno (pai) era o dono das cotas de um fundo de investimento exclusivo, ou seja, que não tinha outros cotistas. Com sua morte, as participações foram transferidas para os dois filhos – mas o dinheiro do fundo seguiu investido, ou seja, não houve resgate.

A Receita quis cobrar imposto de renda (IR) sobre o ganho de capital na herança das cotas. E a primeira turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu a favor da família do fundador da Amil. Não cabe mais recurso.

Fundos de investimento exclusivos são usados por milionários e bilionários como veículo de investimento e também de planejamento sucessório. A decisão no caso da família Godoy Bueno deve contribuir para balizar outras decisões.

Imposto de quase R$ 700 milhões

Representados pelo escritório de advocacia Pinheiro Neto, os filhos do empresário entraram com o processo em 2018, ao serem surpreendidos pela cobrança. Na ocasião, a Receita utilizou uma norma infralegal emitida por ela própria para pedir o recolhimento de IR sobre um suposto ganho de capital, uma vez que o valor de mercado dos fundos aumentou ao longo dos anos. O fisco notificou o administrador dos fundos, o Credit Suisse Hedging-Griffo (CSHG), para fazer o recolhimento do IR na transferência das cotas aos herdeiros.

O custo do imposto citado no processo judicial alcançou R$ 662,5 milhões, em valores atualizados. A alíquota utilizada foi de 15% sobre o ganho de capital, que é a diferença entre a última estimativa das participações declarada pelo empreendedor e o valor de mercado atual do patrimônio.

A partir do valor atualizado do imposto, o InvestNews calcula que o ganho de capital tenha sido de R$ 4,4 bilhões desde o falecimento de Edson Bueno. Estimativas do mercado avaliam o patrimônio total deixado pelo empresário em torno de R$ 7,5 bilhões. 

O advogado Rodrigo Martone, sócio do Pinheiro Neto, faz uma ressalva importante sobre o caso. O representante da família Godoy Bueno explica que a ação não questionou pagar ou não o IR, mas em qual momento fazer o recolhimento. “O imposto vai ser pago. O que a gente discutiu foi o momento de pagamento.” Em lugar de recolher o tributo agora, o desembolso será feito ao término do período de investimento.

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No processo, os herdeiros argumentaram que, como os fundos são fechados, as cotas não podem ser resgatadas. Essa situação só aconteceria no encerramento dos portfólios, que têm prazo de validade. Desse modo, eles receberam as participações pelo o mesmo valor já declarado e não ocorreu uma realização de ganho de capital. O STJ teve o mesmo entendimento.

Com a decisão, os R$ 662 milhões que a Receita receberia agora vão ser pagos ao término de vigência dos fundos. A cifra terá ainda o acréscimo do imposto caso haja valorização do patrimônio de agora até o encerramento. 

O simples adiamento do momento em que o fisco recebe seu quinhão pode trazer um ganho extra para os herdeiros. Esse diferimento fiscal, ou seja, o pagamento do IR só no fim dos fundos, preserva as reservas, que continuam a crescer sem desconto. Por exemplo, se as aplicações tivessem um rendimento equivalente ao do CDI, o ganho mensal hoje estaria em 0,83%. Com aplicação da alíquota de 15% a taxa líquida cairia para 0,70% ao mês.

Em um exercício prático, um investimento de R$ 1.000 subiria para R$ 1.104,27 em 12 meses com CDI cheio. No caso de incidência do imposto como queria a Receita, o mesmo valor aplicado terminaria o ano em R$ 1.087,31. 

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Decisão cria precedente

A interpretação do tribunal vale apenas para o caso dos herdeiros do fundador da Amil. Apesar de ser uma questão específica, o sócio do Pinheiro Neto afirma que a decisão cria precedente para outras famílias solicitarem o benefício.

“Como se trata de uma decisão de tribunal superior, acho que não só os herdeiros desse caso, mas todos os family offices que cuidam dessas cotas ficam muito mais confortáveis”, diz Martone. Para que o entendimento da primeira turma do STJ pudesse valer para todo o país, o advogado considera ser necessário que outros herdeiros entrem com pedidos semelhantes na corte. “Mas não vejo como algo que possa acontecer no curto prazo; deve demorar anos para ter um volume de processos que leve o STJ a uma decisão vinculante.”

O especialista lembra ainda que ações preventivas, ou seja, para evitar o pagamento do IR na fonte, funcionam melhor para os contribuintes. Foi o que fez a família Godoy Bueno. Quando os herdeiros já fizeram o recolhimento do imposto, a possibilidade é pedir na Justiça a devolução dos valores. O risco, no entanto, é de, mesmo em caso de vitória no tribunal, a pendência se tornar um precatório. Isso significa que, mesmo com uma decisão da qual a Receita não possa recorrer, os credores podem levar anos e até décadas para receber o dinheiro de volta.

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