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Governo e CVM preparam plano para melhorar acesso de empresas menores ao mercado de capitais

O Brasil está esboçando um plano para oferecer às empresas de médio porte um melhor acesso ao mercado de capitais do país. A ideia é facilitar o acesso a novas fontes de financiamento para companhias com maior dificuldade de obter crédito.

O mercado de capitais funciona como uma alternativa aos empréstimos bancários para as empresas obterem recursos. Por meio de emissões de títulos de dívida ou de ações, as companhias captam dinheiro de investidores para aplicar no negócio.

O objetivo do governo é facilitar o acesso dos grupos de menor porte aos mercados de dívida e de ações, de acordo com Marcos Pinto, secretário de reformas econômicas.

Pinto, que foi nomeado pelo Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para ajudar a avançar os mercados de capitais no Brasil e estimular a economia, está colaborando com a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no plano, que deve passar por uma consulta pública até o final do ano.

As ideias, que ainda estão sendo desenvolvidas, incluem a redução de taxas associadas às emissões e a simplificação das exigências de auditoria.

Espera-se que o plano resulte em “regras excepcionais de natureza experimental” para empresas de capital aberto com receitas brutas anuais inferiores a R$ 500 milhões (US$ 89,5 milhões), permitindo que essas empresas arrecadem recursos por meio de vendas de ações ou dívidas, segundo comunicado da CVM.

LEIA MAIS: Captação de empresas no mercado de capitais bate recorde em julho

Apesar de um recente boom no mercado de dívida brasileiro, as empresas de médio porte continuam enfrentando dificuldades com as taxas de juros de dois dígitos, que o Banco Central sinalizou irão persistir por mais tempo. A taxa Selic está atualmente em 10,5%, uma queda de 3,25 pontos percentuais desde agosto de 2023, mas ainda muito acima dos 2% observados durante a pandemia.

As empresas de médio porte também enfrentam uma pesada carga tributária. Além disso, um número limitado de bancos oferecem crédito ao segmento, o que torna a dívida mais cara.

“Uma grande empresa vai ao mercado de capitais, diretamente ao investidor, e consegue levantar fundos a um custo muito menor, mas as menores não conseguem porque é caro no Brasil”, disse Pinto em entrevista. “Queremos reduzir o custo das emissões para que as empresas menores também possam realizá-las.”

Os mercados de capitais no Brasil ainda estão em um estágio inicial — as taxas historicamente altas mantêm os investidores avessos ao risco, preferindo aplicar seu dinheiro em títulos do governo em vez de crédito corporativo ou ações (menos de 1% da população investe no mercado de ações local, e os dados mais recentes mostram uma retração).

A superficialidade do mercado é vista como um obstáculo chave para o país aumentar os investimentos e acelerar o crescimento, que ficou atrás da média da América Latina na última década.

Os planos de Pinto também envolvem a implementação de uma reforma tributária recentemente aprovada no setor financeiro, mudanças nas regras sobre como as garantias são usadas em transações de empréstimos, aumento da concorrência no setor financeiro e uma reformulação do mercado de seguros.

O financiamento via mercados de capitais ganhou popularidade, alcançando R$ 338 bilhões no primeiro semestre do ano, mais que o dobro em comparação ao mesmo período do ano anterior, segundo a Anbima, a associação dos mercados de capitais do país.

A emissão de títulos locais, conhecidos como debêntures, aumentou para R$ 206 bilhões nos primeiros seis meses de 2024, um recorde histórico, enquanto as vendas de ações — particularmente IPOs — praticamente desapareceram.

Ainda assim, os empréstimos bancários continuam sendo a principal fonte de financiamento para a maioria das empresas. “Se você abre a porta para o mercado de capitais, sempre haverá uma transação alternativa que você pode fazer”, disse Marcelo Leitão, diretor de securitização da Opea Securitizadora, uma empresa de finanças estruturadas.

Levantar dinheiro no mercado local de títulos poderia reduzir os spreads (custo do crédito para o tomador) das empresas em cerca de 2%, em média, em comparação com os empréstimos bancários, disse Leitão.

Efeito Americanas e outros desafios

Pequenas e médias empresas enfrentam vários obstáculos, incluindo altas taxas de consultoria para estruturar as transações. A falta de reconhecimento entre os investidores também desempenha um papel, assim como as preocupações com os riscos de crédito que levam os investidores a preferirem empresas com maior classificação.

O mercado de alto rendimento, por sua vez, ainda está “muito machucado”, segundo Nicole Vieira Leta, sócia da Polo Capital. Os títulos corporativos brasileiros sofreram um golpe no ano passado, quando a varejista centenária Americanas SA descobriu uma fraude contábil massiva, levando-a a buscar proteção contra credores.

LEIA MAIS: Americanas decepciona (de novo) e ações desabam 60%. Foco agora é na retomada das operações

Rodrigo Gallegos, sócio da RGF & Associados, disse que dois de seus clientes — ambos empresas de médio porte que ele preferiu não identificar — decidiram adiar seus planos de financiamento devido aos altos custos. “Ambos os meus clientes ficaram frustrados porque não conseguiram seguir em frente”, disse ele. Com sede em São Paulo, a RGF é especializada em reestruturação financeira.

Alguns são céticos quanto ao impacto transformador do plano do governo para as empresas. As taxas da CVM e da Anbima representam menos de 0,1% do custo de uma debênture, e as despesas com firmas de auditoria variam, segundo Caio Viggiano, diretor-gerente de renda fixa do Banco Itaú BBA.

Apesar dos desafios, Pinto disse que a intenção do plano é abrir portas para as empresas.

“O que queremos é justamente reduzir esse custo de forma agregada, para que a barreira de entrada seja menor”, disse ele. “O mercado não muda da noite para o dia. Este é mais um passo que precisa ser dado.”

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