Um em cada dez brasileiros – 21,1 milhões de pessoas, equivalente a 9,9% da população – passava por situação de insegurança alimentar grave entre 2020 e 2022, de acordo com o relatório global Estado da Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo, divulgado nesta quarta-feira (12) pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Além disso, quase um terço (32,8%) da população do país está incluído nas categorias de insegurança alimentar severa ou moderada, o que equivale a 70,3 milhões de brasileiros.
Os resultados mostram um agravamento da dificuldade de acesso à alimentação no Brasil quando comparados com os dados divulgados no ano passado. Entre os anos de 2019 e 2021, 15,4 milhões de brasileiros (7,3% da população) estavam em situação de insegurança alimentar grave. E 61,3 milhões de brasileiros (28,9% da população) sofreram com insegurança moderada ou grave.
O aumento é ainda maior se consideramos os dados de 2014 a 2016, período no qual 4 milhões de brasileiros (1,9% da população) estavam em insegurança alimentar grave e 37,6 milhões (18,3%) estavam em insegurança moderada ou grave.
De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), a fase severa da insegurança alimentar é aquela na qual o indivíduo passa fome e está sem alimento há um dia ou mais. Na fase moderada, ainda é possível adquirir comida, mas em quantidade ou qualidade reduzida, comprando menos e se alimentando de embutidos ou ultraprocessados por serem mais baratos.
Além disso, o estudo também mediu a subalimentação crônica dentre os brasileiros, que atingia 4,7% da população do Brasil entre 2020 e 2022. Em números absolutos, 10,1 milhões de pessoas.
A subalimentação é o nível mais extremo provocado pela insegurança alimentar. Se trata de uma situação duradoura, que causa sensação desconfortável ou dolorosa, pois a alimentação não fornece energia suficiente para o bem-estar do corpo.
Os dados nacionais fazem parte de um estudo global da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), do Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (Fida), do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Programa Mundial de Alimentos (WFP).
Outras pesquisas podem apontar números distintos por usarem metodologias diferentes; entenda.
As agências das Nações Unidas alertam que a fome é um problema que se agravou no mundo durante o último período analisado, com aumento de 122 milhões de pessoas nessa situação. Ao todo, o mundo tem cerca de 735 milhões de pessoas sofrendo com a fome, contingente que seria o terceiro país mais populoso do mundo, atrás apenas de Índia e China, e que supera toda a população do continente europeu.
Segundo o relatório, a piora na situação está relacionada à pandemia de Covid-19 e a repetidos conflitos, incluindo a guerra na Ucrânia. Com a tendência indicada pelos dados, a ONU alerta que o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável de acabar com a fome até 2030 não será alcançado.
O diretor-geral da FAO, Qu Dongyu, destacou que a recuperação da pandemia global foi desigual, e que a guerra na Ucrânia afetou a disponibilidade de alimentos nutritivos e dietas saudáveis.
“Este é o ‘novo normal’ em que as mudanças climáticas, os conflitos e a instabilidade econômica estão empurrando os que estão à margem para ainda mais longe da segurança. Não podemos adotar uma abordagem de negócios como sempre”, declarou, segundo texto divulgado pela FAO.
Para o presidente do Programa Mundial de Alimentos (WFP), Alvaro Lario, a meta de acabar com a fome pode ser atingida, mas requer que mais investimentos e vontade política sejam direcionados para dar escala às soluções que já existem.
“Podemos erradicar a fome se fizermos dela uma prioridade global. Investimentos em pequenos agricultores e em sua adaptação às mudanças climáticas, acesso a insumos e tecnologias e a financiamento para montar pequenos agronegócios podem fazer a diferença. Os pequenos produtores são parte da solução. Com o suporte adequado, eles podem produzir mais alimentos, diversificar a produção e abastecer os mercados urbanos e rurais – alimentando áreas rurais e cidades com alimentos nutritivos e cultivados localmente.”
Apesar de a subalimentação causada pela fome ser a situação mais extrema indicada pelo relatório, a insegurança alimentar e os custos de manter uma dieta saudável são outros indicadores que preocupam os autores do estudo.
A insegurança alimentar moderada chegou a 2,4 bilhões de pessoas no mundo entre 2020 a 2022. Os custos de uma dieta saudável se mostraram inacessíveis para 3,1 bilhões de pessoas, causando problemas como 148 milhões de crianças menores de 5 anos com baixa estatura e 37 milhões com excesso de peso.
O relatório mostra ainda o impacto desigual da pandemia e dos choques econômicos globais. Nos países de baixa renda, a insegurança alimentar severa aumentou de 22,5% para 28%, enquanto nos países de renda alta, a variação foi de 1,5% para 1,6%.
O continente africano é o mais afetado pela fome e pela insegurança alimentar: uma em cada cinco pessoas que passa fome no mundo vive nos países da África. A situação é mais grave na África Oriental e na África Central, regiões onde a fome chega a 28,4% da população.
*Publicado por Fernanda Pinotti, com informações de Vinícius Lisboa, da Agência Brasil
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